Esses dias eu estava andando na rua, quando começou a sair luz de tudo  que é lado, até mesmo dos bueiros sombrios e das pessoas. Aí, apareceu  um coelho branco como a neve e me pediu para sair correndo. Por que eu  ouviria um coelho? Daí ele puxou o 38 e eu corri em debandada. Mas tudo  estava branco, eu não sabia onde estava indo. Só sei que quando abri os  olhos, estávamos eu e três coelhos brancos sentados em uma mesa de tomar  chá, daquelas de antigamente, discutindo a existência do Papai Noel  relacionada com a Crise mundial de 1929.
Os três coelhos saltitantes,  felizes e fofinhos deixaram-me lá na mesa de chá e saíram por aí a  matar. Seus disfarces eram perfeitos, enganavam todas aquelas  criancinhas tontas e bestas. Suas tocas eram grandes e espaçosas, para  que coubessem até mesmo as crianças mais gorduchas. Prometiam doces à  elas para convencê-las a irem com eles. Crianças trouxas.
Os coelhos viviam uma vida pacata de crimes bárbaros. E agora, eu sabia de tudo.
Sentada sozinha naquela mesa de chá, resolvi investigar a toca dos  coelhos mais detalhadamente. Levantei e olhei em volta, eu estava numa  sala completamente branca, das paredes ao chão, exceto por uma gravura  na parede, a qual não consegui identificar de longe. Me aproximei e li  as palavras "Mãe, eu não acredito mais nos coelhos" escritas em giz de  cera laranja. Parecia a letra de uma criança, e deveria ser. Contudo, eu  não entendi o significado das palavras. Li e reli, e acabei desistindo,  fui explorar o restante da toca. Achei a porta para sair da sala, a  qual só se podia ver a maçaneta lilás. O outro lado da porta era  extremamente diferente do de dentro. Eu realmente me apavorei e comecei a  suspeitar dos coelhos naquele exato momento. A porta era horrível, que  coelhos de péssimo gosto. Quem é que pinta a porta de rosa-choque e a  cobre de coraçõeszinhos amarelos? Ainda com aquela plaquinha ridícula  "Sala das reuniões carinhosas" e uma lista dos próximos assuntos a serem  debatidos: "O Papai Noel é melhor do que nós?", "Planos para vencer o  Noel", "Como lidar com a popularidade do bom velhinho", "Coelho x Noel,  3ª Guerra Mundial?" e "Roupas vermelhas fazem maior sucesso?". Minha  indignação foi interrompida pelo som da porta da frente se abrindo, e  sem pensar voltei correndo e me sentei novamente na mesa, assobiando para disfarçar.
Os três coelhos abriram a porta com olhar desconfiado e andando sobre  apenas duas patas. O coelho maior e mais gordo tinha um olhar 43 do mal e  me encarava seriamente. Naquele momento eu pude ouvir uma criança  falando algo, não dava pra saber o que exatamente,  contudo não percebi medo em sua voz fina. Foi uma cena estranha e  engraçada, eu sempre vejo humor onde não há. Os três coelhos estavam  parados de frente para mim, me olhando nos olhos. Ouço um deles falar  para o outro "Ela saiu da sala. Ela viu". Continuei a assobiar, tentando  disfarçar o medo em meus olhos, porém isso era difícil. De repente os  coelhos formam um círculo e começar a cochichar, eu não ouço nada. O  coelho mais magro sai da sala e só ficam o coelho de tapa-olho e o  gorducho, que sentam-se à mesa junto a mim. "Nós sabemos que você sabe  do nosso segredo." "Como assim, eu não sei de nada, eu juro, eu não  sei!", mas eles sabiam que eu sabia, mesmo que eu não soubesse que eu  sabia o que eles pensavam que eu sabia. Nesse momento, volta o coelho  magricela, acompanhado de um menino gordinho, todo babado e sorrindo  debilmente com os dentes cheios de chocolate. O coelho de tapa-olho  indaga com sua voz rouca "Mande ele falar" e o coelho magricela cutuca a barriga do menino que diz "Eu amo chocolate, eu gosto mais da Páscoa, eu não gosto de Natal, eu odeio o Papai Noel e vou matá-lo". O coelho do tapa-olho dá um meio sorriso e manda o magrelo  levar o menino. "Pronto, viu só" e voltou a sorrir. Não entendi nada.  Mas perguntei um tanto espantada "Como assim, vocês não matam as  crianças?" "Claro que não, menina tola, só escravizamos elas e as  fazemos odiar aquele velho gorducho de vermelho". Suspirei aliviada,  pedi para sair, mas antes eles me convidaram para tomar mais uma última  xícara de chá, enquanto discutíamos a popularidade do Noel relacionada com a política na Europa no século XIX.
22 de dezembro de 2010 às 11:29
Você tem um p*ta talento!
22 de dezembro de 2010 às 16:25
Obrigada!
E olha só quem falando, tu escreve super bem! *-*
Até, falando nisso, tenho que voltar a acompanhar teu blog, não deu muito tempo ultimamente .-.